POÉTICA


Entre os séculos XIX e XX, a cultura do algodão desempenhou um papel crucial no desenvolvimento de Campina Grande que chegou a ser o 2º maior exportador de algodão do mundo, perdendo apenas para a cidade de Liverpool na Inglaterra. Uma grande parte dessa façanha se deu pela contribuição dos Tropeiros (Mandriani em italiano) que, em tropas de burro, cruzavam a Paraíba e Estados vizinhos para transportar a valiosa mercadoria chamada de "Ouro Branco". 


A escultura, SÉPALAS, foi inspirada no ciclo do algodão de Campina Grande-PB, Brasil. Porém, o seu significado vai além de uma simples representação histórica.  Ela se estrutura a partir de um fragmento botânico e se expande para além da sua própria estrutura física, apropriando-se da aura do lugar onde está exposta. Capta um recorte de uma memória histórica e o perpetua na longevidade do metal que lhe estrutura. Criada para compor o jardim do Mandriani Home & Business, permita-me expor as motivações poéticas que conceberam a minha criação artística.


Na botânica, SÉPALAS são as folhas localizadas abaixo da flor do algodoeiro e servem para proteger o botão floral do algodão. Quando o capulho de algodão amadurece é chegada a colheita e as suas folhas pontiagudas ressecam e se retorcem.  As cinco Sépalas de chapas de alumínio retorcidas que compõem esta escultura não protegem a flor da planta, mas resguardam a memória do valioso passado de Campina Grande.  É no paradoxo entre  a durabilidade do metal e a sutileza dos seus movimentos sinuosos que a escultura guarda a memória da história de Campina Grande. Não é por acaso que a sua cor prateada transcende  a aura do algodão. Durante o dia as Sépalas absorvem a luz ambiente e parecem dançar ao sabor do vento como se entrelaçassem memórias semeadas no solo do tempo. À noite, feixes de luzes brancas emanam de suas entranhas ecoando a memória transcedental do algodão, lembrando-nos da história escrita pelas mãos de quem outrora os colheu. 


É importante saber que o suporte onde repousa a escultura é uma extensão inexorável do monumento. Revestido de porcelanato  mesclado  em tons cinza, beje e branco, a sua base lembra fardos de algodões prensados estendidos no chão como se fosse uma homenagem à valiosa mercadoria que pavimentou a história da cidade.


Neste lugar, no entorno do Açude Velho, existiam lavouras de algodão sendo, também, um espaço de encontro dos Tropeiros que traziam seus animais para o descanso e o abastecimento de água. Por este motivo, a escultura é considerada um Site Specific, termo que significa que ela foi concebida para este lugar específico. Ao ser instalada aqui, a escultura ganha potência poética e uma conexão especial entre a arte e a história de uma das cidades mais importantes do Nordeste no século XIX.


Por fim, diante dos infinitos meandros e labirintos conceituais que uma obra de arte pode revelar a respeito do tempo como veículo poético, concluo este texto me apropriando das palavras da crítica e teórica americana, Rosalind E. Krauss, “[...] a escultura moderna é um meio de expressão situado na junção entre o tempo capturado e a passagem do tempo". É nesse tensionamento temporal que "SÉPALAS" emerge.


INOCENCIO, Fabio de Brito